24 de mar. de 2012

Crítica: Jogos Vorazes

Posted by Aline Guevara On 17:46 3 comentários


“- O que você achou dos participantes que competirão nos jogos deste ano?
- Acho que será uma mistura interessante”

O diálogo poderia ter saído de uma conversa casual entre apreciadores de competições, mas é ao perceber tanta casualidade e descontração ao tratar de um reality show em que jovens são obrigados a matar uns aos outros para vencer que começamos a perceber a terrível realidade de Jogos Vorazes. O filme que entra em cartaz sem muita concorrência nos cinemas brasileiros é a adaptação do romance homônimo Suzanne Collins (confira aqui a nossa resenha do livro).

A comparação com Crepúsculo está sendo alardeada pela Paris Filmes, sem discriminação. É inevitável, já que a distribuidora tem como carro-chefe de seu faturamento a série teen dos vampiros que brilham. Mas para você que não conhece a história, fique sabendo que a semelhança entre Jogos Vorazes e Crepúsculo é que ambas são histórias com personagens adolescentes como protagonistas. Ponto.

No futuro, após guerras e destruição, a América do Norte agora é Panem, um território dividido em 13 distritos e uma Capital, que os subjuga mantendo um regime totalitário e opressor. Após uma tentativa infrutífera de rebelião, os distritos pagaram o preço de sua “traição”: o 13 foi totalmente destruído, como exemplo, e os outros são submetidos aos tais Jogos Vorazes do título. Neles, um casal de jovens de cada distrito, nomeados tributos, é obrigado a participar de um reality show mortal onde são obrigados a matar até que reste somente um vencedor.

A história do filme se passa durante a 74ª edição dos Jogos e acompanha Katniss (Jennifer Lawrence), uma garota de 16 anos do miserável Distrito 12 que precisa sustentar a família e impedir que passem fome, em um lugar em que não é incomum pessoas morrerem de inanição. Ela se oferece para ser o tributo do seu distrito no lugar da irmã menor que havia sido escolhida e junto com Peeta Mellark (Josh Hutcherson), também de 16 anos, parte para a Capital, onde receberá treinamento para os jogos ao lado dos outros tributos e de seu mentor Haymitch (Woody Harrelson), único vencedor da competição pelo Distrito 12.


Um dos grandes problemas do filme é que o diretor Gary Ross se provou muito irregular em seu trabalho. Por um lado ele consegue criar um ambiente de confusão e desespero eficiente na cena de início dos jogos, utilizando-se de recursos como a falta de som e a câmera de mão. Instantaneamente, insere o expectador dentro da chacina na Cornucópia, temendo por todos que se encontram lá. Aliás, em vários momentos dos jogos, o cineasta se utiliza da técnica, que confere ainda mais realismo às cenas. Mas a brutalidade da violência dos jogos é elegantemente tratada pelas câmeras, mostrando relances e se afastando. Estratégia interessante uma vez que muitos "querem ver sangue", mas também uma alterntiva para abaixar a classificação indicativa do filme. Afinal, é um filme que tem alvo entre o público jovem. 

Mas por outro lado, Ross às vezes demonstra uma péssima condução de cena, como quando Katniss realiza a demonstração de sua habilidade com o arco e flecha. A câmera focaliza tanto o prato do porco com a maçã na boca, que elimina qualquer possibilidade de surpresa com a ação da personagem, tornando o desenrolar previsível e enfadonho. Tudo o que a cena não deveria ser. No entanto, a força da história é muito intensa para que esses pontos atrapalhem demais o filme.

Se tem alguém que merece elogios no filme é Jennifer Lawrence, que encarna a protagonista sem hesitar, como se tivesse nascido para o papel. Dando a força e ao mesmo tempo sensibilidade que a personagem requer, a atriz rouba a cena no filme não ficando apagada nem mesmo ao lado de seus excelentes companheiros “coadjuvantes” do filme. Hutcherson, como Peeta, conquista fácil com seu jeito simples e ainda consegue imprimir a situação dúbia que rege seu personagem: afinal, ele está de fato apaixonado pela companheira ou seria estratégia de jogo para favorecê-los? Destaque para Woody Harrelson que vive um Haymitch ora engraçado ora rancoroso, mas sempre com um copo de bebida, o que permite um vislumbre sobre o futuro dos vencedores dos jogos.


Stanley Tucci está simplesmente brilhante no filme, com seu sorriso-de-apresentador-de-televisão absolutamente falso e carismático ao mesmo tempo. Wes Bentley recebeu a missão de criar um Seneca Crane que mal aparece no livro e acerta na composição e cria um homem sádico quando está com o poder de idealizar o jogo, mas inseguro na presença do perigoso Presidente Snow (Donald Sutherland).   

A fotografia e maquiagem do filme também fazem um bom trabalho em ambientar o pobre Distrito 12, com sua população miserável, e depois mostrar a exuberância da Capital, com sua alta tecnologia e conforto, com uma população que se estabelece como uma personificação do ridículo e desnecessário. A crítica a sociedade consumista e alienada, e também ao poder que se utiliza dos meios de massa especialmente reality shows para controle da população é forte no filme, mas será melhor desenvolvida nos próximos, em que poderemos perceber melhor a dinâmica entre a Capital e os distritos.  

Com ritmo frenético, é difícil desgrudar os olhos da tela, especialmente depois do começo dos Jogos Vorazes e, independente de qualquer coisa, é muito bom perceber que ao final dos 142 minutos de filme você nem percebeu o tempo passar e já está pronto para a continuação. 


Obs: Quero deixar registrada uma reclamação a todos os fãs de Jogos Vorazes que quase transformaram a sessão em tortura. Só para esclarecer, eu mesma já li todos os livros da série e gosto muito da história. Mas a falta de respeito com todos que estava na sala foi tanta que prejudicou até a apreciação do filme. Sim, porque ficar dando gritinhos, cantando e batendo palmas no meio da sessão, não é uma forma de mostrar admiração a nada, especialmente dentro de um cinema. Ao final, ouvi mais comentários reclamando das interferências irritantes do que sobre o filme em si. É assim que ajudam a promover o filme? O mais engraçado (para não dizer trágico) é que esses supostos fãs da saga têm atitudes muito semelhantes àquelas que Collins critica em seu livro. Na cena em que Effie pede uma salva de palmas para Katniss e Peeta após serem selecionados somente ela própria aplaude... e toda a minha sala de cinema. Depois de uns segundos, percebendo o papel de ridículo na cena em que os habitantes do Distrito 12 mostram repulsa aos Jogos em silêncio e fazendo o gesto da saudação respeitosa com três dedos, as palmas cessam e mãos levantam copiando o gesto. Mais condicionados, impossível.

É uma saga muito boa, mas, aparentemente, com fãs muito ruins.

3 comentários:

Aline, você está narrando a situação típica de uma sessão de pré-estréia? Assisti na tarde desta sexta-feira e apesar de muita conversa de algumas adolescentes no fundo da sala, não houve tantos problemas assim. Fico admirado que certos filmes ainda atraiam gente tão sem noção. Acho que esses comerciais de início de sessão deviam orientar o povo a controlar os hormônios também, se é que é possível. Talvez uma campanha estilo anti-funkeiros-sem-fone-de-ouvido.

O filme foi incrível, sem esageiro nenhum o melhor que já vi em toda a minha vida! Estou super ansiosa para a continuação pois o filme retrada uma ficção porém mostrando muita realidade da nossa vida!

Então Israel, não fui assistir na pré-estreia, mas sim na sessão das 21h da sexta-feira mesmo. E mesmo assim, vi esse tipo de manifestação. Concordo com você, devia existir uma campanha de controle de hormônios nas salas de cinema!

Anônimo, também estou ansiosa pelo segundo. A história de Em Chamas é tão boa quanto ou até melhor que Jogos Vorazes.

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